segunda-feira, 4 de março de 2013

Sobre a reflorestação do Parque Nacional da Peneda-Gerês

Aproveite-se as sinergias que parecem existir na região entre autarcas e a área protegida, para se promover a reflorestação necessária de uma das jóias naturais do país.
Li há uns dias, com satisfação, uma notícia que dava conta do interesse dos autarcas da área que abrange o Parque Nacional da Peneda-Gerês em conseguirem uma rápida reflorestação desta magnífica área protegida.
De acordo com a notícia, em 12 anos ardeu uma área correspondente a 38% do parque, o que é dramático. Estes autarcas manifestavam o seu descontentamento e contestavam a inoperância das entidades públicas, entre outras coisas, alegando que pouco ou nada tem sido feito para cuidar e reflorestar as áreas ardidas. Questionavam a ausência de intervenção activa no combate à erosão dos solos e poucas acções de reflorestação – que parece só ter acontecido graças à generosidade e à acção de cidadãos e empresas.
Vejo com agrado que os autarcas mencionam com frequência a necessidade de reflorestar com espécies autóctones (nativas do território nacional). As notícias referiam que as organizações de ambiente defendem a regeneração natural dos habitats nativos, reconhecendo a necessidade de se aguardar algumas décadas, e denunciam o aumento dos matos e a provável ocupação preferencial por esta tipologia de cobertura, uma vez que a ocorrência de fogos é cada vez maior. Este é um facto incontornável na paisagem portuguesa: os ecossistemas florestais vão sendo substituídos por urzais, giestais e tojais ou formações naturais mistas de urzes, giestas, tojo e carqueja, conhecidos pela designação genérica de matos.
Os fogos frequentes, a par de outras práticas que persistem, são factores que continuam a contribuir para a desertificação das nossas montanhas
Em Portugal, antes das glaciações, as montanhas eram cobertas por florestas sempre-verdes (laurisilva) e, durante a última glaciação, o território teve uma cobertura florestal semelhante à actual taiga, que foi naturalmente substituída por florestas mistas de árvores sempre-verdes e caducifólias, transformando em grande medida o país num imenso carvalhal caducifólio (alvarinho e negral) a norte do Tejo e perenifólio (azinheira e sobreiro) no Sul. A progressiva destruição dessas florestas modificou as nossas montanhas, que passaram a estar predominantemente cobertas por matos de urzes, giestas, tojos e carqueja. Em especial a partir do século XIX, foram rearborizadas com pinheiro bravo, estabelecendo-se importantes manchas de pinhal. Com as opções florestais das últimas décadas, parte dessas montanhas e muitas outras zonas do país estão hoje transformadas em imensos eucaliptais, sendo o eucalipto a principal espécie do panorama florestal português e registando Portugal a maior área de eucaliptal da Europa. A última fase desta degradação ecológica tem-se verificado com uma acentuada desertificação em muitas zonas de montanha e com a instalação progressiva de extensas manchas de acacial.
É evidente que os fogos frequentes, a par de outras práticas que persistem, são factores que continuam a contribuir para a desertificação das nossas montanhas. As referências aos fogos em Portugal recuam pelo menos aos finais do século XII, e os seus efeitos negativos modificaram de modo quase integral a cobertura vegetal de Portugal e o consequente assoreamento de uma grande parte dos nossos rios.
Há um Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês que terá certamente áreas de intervenção específica, estabelecendo prioridades para a reflorestação do parque e para a monitorização dos processos de regeneração natural. Aproveite-se assim as sinergias que parecem existir na região entre autarcas e a área protegida, para se promover a reflorestação necessária de uma das jóias naturais do país. Uma floresta diferente; uma floresta que reponha um equilíbrio entre a função económica de produtividade silvícola e a conservação de recursos múltiplos que a floresta deve assegurar.
Fonte: Público, em 4-03-2013

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