Nas legislativas de 2009 foi a freguesia mais abstencionista de Portugal. Na Gavieira, em 653 eleitores só 163 votaram há três anos. Os da terra dizem que quase todos vão às urnas e a culpa dos números, ao que parece, é dos emigrantes. Enfiada num vale da serra do Gerês, Gavieira é uma espécie de postal ilustrado, com paisagens dignas de filme, cavalos selvagens e vacas a congestionarem uma exígua estrada onde passam automóveis de hora a hora. Mas esta freguesia de Arcos de Valdevez é também um paradoxo das estatísticas eleitorais, pois como é possível, nas legislativas de 2009, ter sido registada uma abstenção de 75,09 %, quando os que lá moram garantem que quase todos vão votar? A resposta até foi fácil de encontrar, mas sempre depois de algum espanto à pergunta: “Sabia que a Gavieira é a terra onde menos se vota em Portugal?”. “Não. Como é possível se eu voto sempre”, diz Manuel. “É mesmo verdade?”, questiona Esperança. “Aqui só estão velhinhos”, constata Armando. Já Francisco, perante as suas vacas, baralha ainda mais a história. “Tenho ouvido falar nisso tenho e vou-lhe dizer mais. Dizem que menos gente vota, mas acho que aparecem mais votos do que as pessoas que cá estão. É o que tenho visto”, alarma, justificando-se: “Não sei como é possível. Olhe é a fiscalização que temos”. Francisco Gonçalves é uma espécie de guardador de gado moderno. De carro, patrulha o trajeto das suas vacas e só sai do Opel Corsa azul a gasóleo para orientar os animais para outras pastagens. Com cajado na mão, entre sons próprios de linguagem para animais, Francisco ajuda a esclarecer os números da política. “Eu voto sempre e acho que devia ser obrigatório p ara toda a gente. Aqui, todo o mundo vota. Vota quem cá está, o problema é os emigrantes”, elucida. Na aldeia, sentado num alpendre de pedra, a ver passar o tempo ao ritmo do som do relógio da igreja, Armando faz o retrato da generalidade de um interior desertificado. “A freguesia tem muita gente, mas estão no estrangeiro. Os novos andam todos fora, não há dinheiro”, lamenta. Escassos metros acima, Esperança acabou de dar de comer às galinhas. “Aqui no nosso lugar há muita gente que não vai votar porque não sabe onde, aqui a gente é toda velha. A gente nova está toda para a França”, diz, rematando com outra estatística: “Nós temos talvez 20 velhotes de 80 anos, eles não sabem onde ir votar”, garante. Manuel Correia vem a descer com um molhe de pencas debaixo do braço. “Nós devíamos fazer o seguinte: Um por todos e todos por um levantemos este país e depois vamos fazer eleições”, propõe. Em frente da casa do filho, que só está ocupada duas vezes por ano quando “vem de vacances”, Manuel invoca o lema da revolução francesa, que em 1946, quando ele andou por França, ouvia dizer: “Liberté, égalité, fraternité, mas eu nunca vi isso. Aqui, cada um alambaza o mais que pode”. No alpendre, uns metros separado da pequena capela e do cemitério primorosamente arranjado, continua Armando, que explica o caminho da junta de freguesia. Trajecto que garante tomar no dia 5 de Junho. Francisco está nos montes com as suas vacas, enquanto Esperança ainda dúvida da veracidade da informação: Gavieira, a freguesia com maior abstenção. “Mas é mesmo verdade? Pronto então vamos lá ver domingo no que isto vai dar”. Assim, veremos. Fonte: Correio do Minho, em 29-05-2011
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