quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Serra do Gerês inspira escultura de paraquedista

Jorge Rodrigues tem o privilégio de poder dividir o seu tempo entre duas das actividades que mais gosta, sem ter que dar primazia a uma sobre a outra: o paraquedismo e a escultura. “Normalmente consigo conciliar os horários de uma e outra actividade”, conta ao Terras do Homem este escultor e instrutor de paraquedismo desportivo, nascido em Vila Verde e que durante décadas viveu na Vila de Prado.
Campeão nacional de paraquedismo, na modalidade de ‘Precisão de aterragem’, entre 2004 e 2006, este vilaverdense – agora a residir em Braga – cedo manifestou possuir outros dons que o levaram a desenvolver sempre actividades paralelas. Se o gosto pelos saltos com pára-quedas foi alimentado pelos praticantes do aeródromo de Palmeira – que conseguia avistar de uma árvore à qual subia para assistir às provas ali existentes – a ligação à escultura é quase umbilical.
“Desde que me conheço que sempre gostei de pegar em qualquer tipo de material e moldá-lo, com recurso a diversas ferramentas. Desde pequeno, sempre peguei numa faca ou numa outra ferramenta qualquer e ia trabalhando pedaços de material que ia encontrando”, recordou Jorge Rodrigues.
Nascido a 13 de Novembro de 1971, este pradense vive em união de facto e tem dois filhos. O seu percurso académico iniciou-o na Vila de Prado, onde cumpriu o primeiro ciclo. Seguiu-se o ciclo preparatório, realizado na Escola André Soares, em Braga, e o liceu, concluído no ‘Sá de Miranda’. Mais tarde, complementou a sua formação com um curso de técnico de electrónica, de três anos, com equivalência ao 12º ano, na extinta ‘Grundig’ de Braga, então conhecida como ‘Electrónica de Portugal’.
Jorge Rodrigues assegura que nenhuma das suas profissões goza de supremacia em relação à outra. “Sempre que preciso de tempo para a escultura ou para a instrução de paraquedismo, lá me arranjo e consigo orientar-me em função da importância de cada um dos projectos que tenho entre mãos a cada momento”, sublinha.Escultura procurada por clientes de todo o mundo
A primeira ‘paixão’ surgida na vida de Jorge Rodrigues foi, sem dúvida, a escultura. Resultado deste gosto primitivo, desde muito cedo que este pradense começou a desenvolver uma actividade profissional remunerada ligada a esta área. As suas peças podem ser feitas em diversos materiais e consoante os projectos que tem em mãos, a cada momento. “Podem ser peças feitas em cerâmica, ferro, pedra, madeira. Desde sempre me preocupei em procurar ser versátil”, explicou.
Com um “vasto espólio” espalhado pelos cinco continentes, Jorge Rodrigues orgulha-se de ser procurado por clientes de todo o mundo. As suas peças resultaram já na realização de “diversas exposições”, nos mais variados eventos. As suas peças podem ser adquiridas a preços que vão desde os 15 euros, até aos 600 ou 700.
Fruto da “relação directa” que o seu trabalho tem com as terras do Gerês, desde há uns anos a esta parte que este escultor tem assentado ideias naquela zona do concelho terrabourense, nomeadamente no Parque de Campismo de S. João do Campo, onde labora actualmente. Daí, tem vendido peças para todo o mundo, através dos turistas que visitam o ‘santuário’ natural do Gerês. “O Gerês é a minha fonte de inspiração, é fonte de matéria-prima. Por outro lado, o meu trabalho também revela um pouco o misticismo da serra”, contextualizou.
A infância e o pensamento infantil, garante Jorge Rodrigues, é ainda “fundamental” nas peças resultantes do seu trabalho, isto porque “a influência do Gerês e da serra” na sua escultura “de nada serviriam, se não conseguisse, ainda, manter um olhar pueril sobre o Gerês”.
“Esta serra ainda mantém um encanto, para mim, que transporto desde a infância. Ainda consigo olhar para o Gerês com olhos de criança e, se calhar, é por isso que consigo transportar a magia desta serra para as peças que crio”, observou o escultor.
Sem fazer distinções, Jorge Rodrigues considera que o seu público-alvo abrange qualquer classe social e faixa etária, garantindo que, “desde os mais novos aos mais idosos, toda a gente tece comentários positivos” às peças que vêm ser feitas pelas mãos deste pradense. “É muito positivo, uma vez que, por muito que não possam levar esta ou aquela peça, por razões financeiras ou outras, deixam sempre o alento que ajuda a continuar a lutar e a trabalhar desta forma”, agradeceu Jorge Rodrigues.
“No entanto, antes de mais, as peças têm que me causar agrado a mim. Enquanto me sentir feliz com o resultado do meu trabalho, hei-de continuar a subir, degrau a degrau, esta escada que já nem me lembro ao certo quando comecei a trepar. Vou tentando, à minha maneira, aperfeiçoar o meu trabalho, evoluir as minhas técnicas e aprender coisas novas com recurso às mais variadas fontes de ensinamento”, sublinhou, recordando que, muitas vezes, o seu avanço se deu recorrendo a um estilo de aprendizagem “auto-didacta”.
“Existem muitos livros, muita documentação acerca desta arte e eu procuro sempre manter-me atento”, acrescentou o escultor, reconhecendo que dificilmente enveredará por uma formação superior, até porque “o mercado deixa pouca margem de manobra a quem queira evoluir nesta área”.
Subida às árvores resultou em instrução de paraquedismo desportivo
Aos 20 anos, Jorge Rodrigues ‘lançava-se’ numa nova aventura: o paraquedismo desportivo. Em criança, contava Jorge Rodrigues, era frequente este pradense subir às árvores. “De uma delas, bem alta, conseguia avistar os paraquedistas que aterravam no aeródromo de Palmeira. De tanto me deliciar com o que via, acabou por nascer o bichinho pelo paraquedismo. Uma semente que acabou por germinar e que resultou no desenvolvimento de uma profissão ligada à área, nomeadamente através da instrução de paraquedismo desportivo”, narrou.
Desde então, nunca mais deixou de praticar. Paralelamente, foi realizando diversas formações que o levaram a ser instrutor da modalidade. Esta instrução é ministrada a diversas associações ou clubes de paraquedistas, como a de Viatodos, onde Jorge Rodrigues ensina algumas das técnicas ligadas à prática deste desporto.
Trata-se, no seu entender, de um “desporto caro”, até porque “os custos de manutenção de um avião, não são equiparáveis aos de um carro”. “Cada salto poderá ir dos 35 aos 50 euros, por exemplo”, refere.
No entanto, essas dificuldades nunca o demoveram e, em resultado desta perseverança, Jorge Rodrigues e a sua equipa de paraquedismo, Yellow Team, acabariam mesmo por se sagrar campeões nacionais da modalidade, na disciplina ‘Precisão de aterragem’, entre 2004 e 2006. Internacionalmente, este pradense já participou em competições europeias e já esteve qualificado para mundiais da modalidade.
“Entre 2004 e 2006, ganhámos tudo o que havia para ganhar, a nível nacional, no paraquedismo desportivo. Sagrámo-nos tri-campeões nacionais de ‘Precisão de Aterragem’, destronando as equipas militares que, até então, dominavam claramente os campeonatos. Fomos a primeira equipa civil a fazê-lo”, destacou o escultor/paraquedista. Devido ao falecimento de um dos membros e ao abandono de um outro, a equipa Yellow Team viu o seu contingente de praticantes reduzido a seis membros, o que dificultou a continuidade dessa supremacia. Ainda assim, “os bons resultados continuam”.
Para o futuro, a única meta traçada por Jorge Rodrigues é a continuidade da prática da modalidade, até “o mais tarde possível”. “Quero chegar a velhinho e continuar a saltar”, atirou.Dinheiro condiciona gostos
Terras do Homem: Quais os momentos mais marcantes que já viveu no decurso da prática do paraquedismo?
Jorge Rodrigues: Seguramente, os campeonatos nacionais conquistados estão entre esses momentos. Mas, poderíamos falar tão somente numa mensagem passada eficazmente no decurso de uma instrução ministrada a um qualquer conjunto de alunos da modalidade. É gratificante ouvirmos, a posteriori, algumas pessoas sublinharem que conseguiram captar e guardar a informação, pela forma como ela foi transmitida. Este é um meio relativamente pequeno, ainda, em termos desportivos, em Portugal, pelo que facilmente nos cruzamos e vamos obtendo feedback.
TH: E mazelas, já teve muitas?
JR: Felizmente, nem por isso. Há muitos anos atrás, parti uma perna e ainda fiz uns 12 saltos com a mesma engessada. Não é algo de que me orgulhe muito, mas a ‘febre’ da prática da modalidade, associada à idade em que raramente medimos responsavelmente as situações, resultaram nessa situação caricata.
Acima de tudo, o paraquedismo é um desporto seguro, se forem respeitadas as normas da prática da modalidade.
TH: No que diz respeito à escultura, que também desenvolve, acha que os portugueses estão pouco sensibilizados para a sua importância?
JR: Acho que não. Não queria pôr as coisas nesses termos. As pessoas dão-lhe o devido valor. Agora, o que pode, por vezes, acontecer é que as mesmas não tenham condições financeiras para mostrar esse reconhecimento. Muitas vezes, tenho pessoas que passam por aqui e que apreciam o trabalho e que até gostariam de levar alguma peça, mas financeiramente têm outras prioridades e acabam por não a adquirir.
Toda a gente sabe que estamos condicionados nessa vertente e, também por isso, me tenho dedicado a fazer peças mais pequenas e acessíveis.
Gostos e preferências
Onde reside?
Em Braga.
Profissão?
Escultor e paraquedista. Faço, ainda, um part-time no Pingo Doce.
Últimas férias?
Vou fazendo férias, não as costumo planear. É um desperdício, no meu entender, gastar um mês de férias seguido, num determinado local, e trabalhar os restantes 11.
Último hobby?
Pesca submarina, fazer para-motor, entre outros.
Carro que usa?
Renault Laguna.
Almoço de hoje?
Pizza caseira.
Que bebeu hoje?
Cerveja.
Perfume que usa?
Paco Rabanne.
Marca de roupa que usa?
Não tenho uma em concreto.
Último livro que leu?
‘Fernão Capelo Gaivota’, de Richard Bach.
Último filme que viu?
‘A tempestade’.
Onde gostaria de morar?
Não gostaria de morar num sítio só, gostaria de morar em vários sítios, junto ao mar, perto da serra, poder passar pela cidade.
Que profissão gostaria de ter?
Acima de tudo, gostaria de ser mais bem compensado pelo que faço.
Férias preferidas?
O meu tipo de férias é muito simples, passa por ter dinheiro no bolso, um mapa e o carro à disposição. Nessa perspectiva, gostei de explorar a Espanha.
Passatempo preferido?
São vários. Descer o rio de kaiak, por exemplo. Tudo o que possa estar ligado a elementos como a água, ar ou terra.
Carro que gostaria de ter?
Não tenho preferência.
Prato preferido?
Arroz de tomate com sardinhas pequeninas, de petinga.
Bebida preferida?
Bebo de tudo.
Perfume preferido?
É a mulher que escolhe, não ligo muito.
Marca de roupa preferida?
Roupa e calçado todo o terreno.
Livro preferido?
‘A Pérola’, de John Steinbeck.
Filme preferido?
‘A vida é bela’.
Fonte: Terras do Homem, em 1-09-2011

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