João Manuel Martins vive no lugar da Refonteira, em Gondoriz, freguesia de onde é natural e onde sempre viveu e, tal como muitos outros terrabourenses, para sobreviver, foi obrigado a fazer contrabando entre Portugal e Espanha.
Hoje, este gondoricense que já conta com 80 anos é um dos poucos contrabandistas ainda vivos e conhece, como a palma da sua mão, a rota do contrabando onde, naquele tempo, andou juntamente com dezenas de homens terrabourenses, principalmente, de Brufe, Gondoriz e Cibões.
Este contrabandista garante que todo aquele que se aventurava a vencer as agruras da Serra Amarela e a desafiar a vigilância zelosa da “guarda” tinha de ser um bom conhecedor dos trilhos da montanha, de possuir um grande sentido de orientação, de ter muita disciplina e, ainda, de ter espírito de sacrifício, entreajuda e solidariedade.
Este gondoricense afirma à nossa reportagem que a pé, durante a noite e no silêncio da noite,os caminhos na Serra Amarela eram calcorreados por todos aqueles que faziam do contrabando o seu ganha pão. “Era um negócio de tostões, mas era a minha única fonte de receita. Naquele tempo, ganhava-se muito pouquinho, mas, naquela época, não tínhamos onde ganhar dinheiro. Sempre eram alguns míseros tostões que entravam na nossa casa!” Às vezes, não ganhavam para a despesa porque quando transportavam para Espanha, por exemplo, ovos e tinham de fugir às perseguições da “guarda”, partiam-nos e lá se ia “por água abaixo o nosso pequeno investimento”. Tudo era feito a pé e sempre que os ovos rareavam “chegávamos a ir comprá-los muito longe. Era uma vida escrava” lamenta-se. “Às vezes, saíamos com os ovos acomodados em palha nas mochilas e chegávamos a Espanha com eles todos partidos. Não se aproveitava nenhum ovo!”Hoje, este gondoricense que já conta com 80 anos é um dos poucos contrabandistas ainda vivos e conhece, como a palma da sua mão, a rota do contrabando onde, naquele tempo, andou juntamente com dezenas de homens terrabourenses, principalmente, de Brufe, Gondoriz e Cibões.
Este contrabandista garante que todo aquele que se aventurava a vencer as agruras da Serra Amarela e a desafiar a vigilância zelosa da “guarda” tinha de ser um bom conhecedor dos trilhos da montanha, de possuir um grande sentido de orientação, de ter muita disciplina e, ainda, de ter espírito de sacrifício, entreajuda e solidariedade.
Os contrabandistas, da rota da Serra Amarela, levavam para Espanha principalmente ovos, azeite e sabão e para Portugal podiam trazer produtos, tais como: boinas, botas, meias, tabaco, chumbo para carregar as espingardas, mas o produto que mais “trazíamos eram enxadas. As autoridades nunca revistaram a minha casa porque nunca houve denúncias. Contudo, se o fizessem nunca encontrariam nada. Tudo o que eu trazia de Espanha era escondido, principalmente, no meio do monte”.
Os produtos que levavam de cá eram comprados nas “vendas” das aldeias ou aos lavradores locais, mas, às vezes, quando os ovos eram insuficientes iam comprá-los ao concelho de Amares, nomeadamente a Caldelas, a Rendufe e à Feira Nova.
De Brufe até Espanha, percorrer o caminho, demorava pouco mais de 4 horas, mas de Gondoriz até Torneiros a “caminhada levava de 7 a 8 horas. Mas este tempo podia ser bem maior! Tudo dependia do caminho. Só conseguíamos fazer neste tempo, se fossemos pelo cimo da Serra Amarela e sem qualquer tipo de percalço”.
Na Serra Amarela, a caminhada era feita normalmente à noite, em silêncio, sem fumar, em grupo e em fila indiana. “Às vezes, percorria-se a rota do contrabando de dia, principalmente, quando estava nevoeiro”. Na frente da fila, que podia atingir umas boas dezenas de metros, ia sempre alguém que conhecia bem os trilhos. “Chegámos lá a ir 75 homens que formavam uma fila com uma distância como daqui de Gondoriz a Terras de Bouro. Vergados pelo peso das nossas mochilas, íamos separados para não sermos apanhados e, às vezes, quando desconfiávamos que podia aparecer a guarda, púnhamos na dianteira, muito distante de nós, alguém que levava um fardo de pouco valor e, quando era interceptado pela guarda, fazia um alarido tal que nós, mesmo a uma distância considerável, ouvíamos e fugíamos sem sermos apanhados. Outras vezes, pressentíamos a presença da guarda e tínhamos de desviar-nos para o lado do Lindoso, o que nos atrasava muito e nos fazia aumentar o tempo da caminhada”.
No seu tempo, havia três postos da guarda fiscal: um no Campo do Gerês, outro em Carvalheira e outro em Vilarinho da Furna. Quando os guardas os interceptavam, gritavam “larga”, disparavam para o ar e quando já não tinham tiros rolavam pedras pelo monte abaixo. “Os guardas sempre que nos apanhavam, tiravam-nos as coisas todas e sempre que fugíamos da autoridade corríamos muitos riscos e perigos. Andar no meio da Serra Amarela era muito perigoso porque havia sítios que se lá caíssemos, morríamos e apodrecíamos sem que ninguém nos encontrasse. No Inverno, era difícil devido, principalmente, à neve, ao gelo e ao vento. A neve e o gelo conservavam-se quase até Abril no alto da serra o que tornava muito perigosos estes trilhos.
A víbora e o lobo nunca constituíram ameaças. “Sempre que nos sentávamos para descansar sacudíamos a vegetação para afugentarmos as víboras. Cheguei a ver o lobo sozinho, mas não se atira a ninguém!”
Aos oitenta anos, este contrabandista gondoricense que “vende frescura”, disponibilizou-se para nos acompanhar e mostrar “in loco” as armadilhas que esconde a Serra Amarela. Informou-nos que percorreu o trilho do contrabando recentemente. Calcorreou, juntamente com o Dr. Manuel Martins a Serra Amarela pelo lado do Posto Emissor do Muro e, também fez, juntamente com o nosso ilustre doutor, a caminhada de Brufe a Torneiros.
Publicado no jornal "Geresão", em 20 de Abril de 2010
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