segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Presidente da Junta de Freguesia de Brufe em entrevista ao jornal «Terras do Homem»

Manuel Alves tem 48 anos, é casado e tem duas filhas. Com o 12º ano de escolaridade completo, este empresário da construção civil optar por passear nos seus tempos livres. “Adoro viajar, conhecer outras culturas, novas mentalidades”, explicou o presidente da Junta de Brufe que elege Angola como destino de férias de sonho.
À mesa, o autarca privilegia o pica no chão, acompanhado de um “bom vinho”. Em termos de recolha de informação diária, Manuel Alves confessa-se mais adepto do audiovisual.
«Não vivemos numa área protegida ou reservada… vivemos numa área abandonada”
Presidente da Junta de Freguesia de Brufe há 19 anos, Manuel Alves assistiu nos últimos anos à crescente desertificação daquela, como doutras freguesias do concelho de Terras de Bouro. À falta de emprego, o autarca alia as restrições impostas aos habitantes de zonas classificadas como Reserva Agrícola ou Reserva Ecológica para justificar a fuga dos conterrâneos para países onde consigam melhores oportunidades de vida. Manuel Alves lembra e lamenta, ainda, o negado projeto da instalação de um parque eólico na freguesia, poderia ter sido “a tábua de salvação” para as gentes de Brufe.
Terras do Homem: Qual a grande prioridade para a freguesia de Brufe para o que resta cumprir do atual mandato?
Manuel Alves: Num tempo de crise como o que vivemos, com as limitações com que nos confrontamos, temos que ser realistas. Por isso, antes de mais, creio que a prioridade vai para as acessibilidades. No lugar de Cortilhas, gostávamos de proceder à substituição de toda a calçada no interior do lugar. No caso do lugar do Assento, proceder a uns arranjos em caminhos agrícolas para facilitar a vida a quem ainda se dedica a esse setor na freguesia.
TH: Que outras obras gostaria de ver feitas até final de 2013, na freguesia?
MA: Há uma outra obra que gostava de ver concluída, mas não sei se o conseguiremos fazer antes do final do mandato. Refiro-me à requalificação de um salão no edifício da sede da Junta de Freguesia. Trata-se de um salão de convívio que poderia ser muito importante para sustentar o dinamismo de uma freguesia com pouco mais de meia centena de habitantes.
TH: Dos mandatos anteriores, quais as obras feitas que destacaria? Quais aquelas que mais o orgulham, enquanto presidente da Junta?
MA: Acima de tudo, o que mais me orgulha é deixar a freguesia com uma rede de saneamento instalada que cobre a totalidade da freguesia e uma rede de abastecimento de água pública que serve todas as habitações de Brufe. Além disso, fizemos um grande trabalho ao nível da eletrificação e da iluminação pública no interior da freguesia.
Por outro lado, conseguimos convencer a autarquia a fazer uma ligação alternativa entre Brufe e S. João do Campo. Até aqui, as gentes desta freguesia eram obrigadas a ir a Vilar para subir à freguesia do Campo do Gerês. Da mesma forma, um turista que tivesse nessa freguesia, se quisesse vir a Brufe tinha que fazer o trajeto inverso. Ou seja, esta estrada até em termos de fomento do turismo rural se revelou fundamental. Aliás, veio beneficiar muito a iniciativa privada e levou à criação de um restaurante de referência na região e no país.
TH: É fundamental criar condições para a instalação de negócios dinamizadores…
MA: É uma das nossas grandes prioridades: o apoio à iniciativa privada, no sentido de criar emprego na freguesia e que fixe a população em Brufe. No caso do restaurante, fomos felizes, noutros nem por isso. Nem sempre o apoio institucional se revelou e, em muitos casos, as burocracias foram demasiadas e levaram ao não surgimento de outros negócios.
TH: De que problemas está a falar? O que seria preciso para ajudar a economia nesta zona?
MA: Era preciso que houvesse outro tipo de apoio aos pequenos e médios empresários, nomeadamente ao nível da isenção de pagamento de determinadas taxas.
Por outro lado, existem condicionalismos inerentes ao facto de estarmos situados numa zona da rede natura o que é, em termos do fomento económico altamente prejudicial. Se querem designar os terrenos de Brufe como pertencentes a uma área protegida, têm que compensar as populações de alguma forma. Não se pode dizer às pessoas, aos proprietários, “vocês não podem fazer isto ou aquilo” sem lhes dar contrapartidas. Porque sem a existência de condições para a criação de emprego, é impossível evitar-se a desertificação destes meios. Vivemos numa zona abandonada. Aquilo não é uma área protegida ou reservada, é uma área abandonada. Se vivêssemos numa área protegida, não dificultavam a atividade do pastoreio. Como se sabe, a criação de gado leva ao consumo, por parte dos animais, de muito do material combustível que arde nas épocas de incêndio.
“Parque eólico podia ter sido tábua de salvação da freguesia”
TH: Brufe é hoje uma freguesia bastante desertificada. Como inverter uma tendência que leva a uma diminuição drástica da população residente?
MA: Verdade. Hoje, na freguesia de Brufe vivem apenas 50 pessoas. E não se pode parar este decréscimo se não se apostar na criação de emprego em Brufe e nas freguesias vizinhas, seja pelo lado do turismo, seja em que outra área for.
Além disso, seria necessária uma revisão do Plano Diretor Municipal que, no meu entender, devia à partida designar-se Plano de Desenvolvimento. Podiam criar-se em cada freguesia determinadas zonas para construção que não levassem tão rapidamente as pessoas a fugir das suas localidades de origem.
No entanto, existem condicionalismos de várias ordens. Por exemplo, em tempos existiu já um acordo da Freguesia com a Mota Engil para a criação de um Parque Eólico em Brufe. Trata-se de uma aposta na criação de energia renovável, de uma energia limpa, não poluente, que iria trazer dividendos e uma fonte de receita valiosa para a própria Junta de Freguesia e proprietários dos terrenos privados. Algum especialista defendeu que não se deveria instalar aqui um parque eólico e, no meu entender, julgou muito mal. Se queremos cuidar do ambiente, também temos que nos preocupar com o que é feito para conseguirmos a energia de que necessitamos. O parque eólico podia ter sido tábua de salvação da freguesia. Greiro a greiro enche a galinha o papo.
Reforma administrativa: “estão a dar mais um passo para a desertificação das aldeias”
TH: Concorda com a lei que limita o número de mandatos possíveis a um presidente de Junta?
MA: Concordo perfeitamente. Julgo que três mandatos são mais que suficientes para se desenvolver um projeto que traga desenvolvimento a uma freguesia. Além disso, ao fim de 12 anos é natural haver alguma desmotivação nos autarcas que, muitas vezes, só se recandidatam por pressão das pessoas que os encorajam a reassumir novo mandato.
TH: Qual o sentimento que o invade por ser este o seu último mandato enquanto presidente da Junta de Freguesia de Brufe?
MA: Eu sou natural de Brufe e servi orgulhosamente a minha freguesia ao longo de todos estes 20 anos. Dei o meu melhor durante todo este tempo e, agora, encerra-se um ciclo. No entanto, nos tempos que se aproximam estarei sempre atento à condução dos destinos desta localidade e sempre pronto a ajudar no que for preciso. Mas também serei uma voz de crítica construtiva se vir que as coisas não estão a ser levadas no caminho correto.
TH: Concorda com a reforma administrativa que está a ser preparada para o país, ao nível das juntas de freguesia?
MA: Não. Essencialmente, porque considero que as juntas de freguesia vão ser extintas onde elas fazem mais falta. Se me falassem na extinção de Juntas nos meios urbanos, eu até concordava, agora nos meios rurais elas são vitais. Até porque, com o encerramento das escolas, as freguesias já perderam muito do dinamismo que tinham. Se extinguem o único órgão autárquico que tem alguma proximidade com as pessoas, estão a dar mais um passo no sentido da desertificação destas aldeias.
Por outro lado, embora os responsáveis por estas medidas julguem que irão poupar algum dinheiro com isto, o que é certo é que não são as freguesias que alimentam o défice público. Porque não fizeram como já se fez na época do estado novo e anunciavam aos presidentes de Junta que só iriam disponibilizar dinheiro para obras consoante as possibilidades do estado? Era melhor do que estar a extinguir as freguesias. Eu não me importava de trabalhar consoante as possibilidades, pela causa apenas. A junção de freguesias vai, no meu entender, trazer ainda alguns problemas entre as gentes de cada terra.
TH: Qual seria, no seu entender, o melhor cenário, para a freguesia de Brufe?
MA: Para a nossa freguesia e para as vizinhas, julgo que o melhor cenário será juntar-se Brufe, Cibões e Gondoriz. No que diz respeito ao resto do concelho, a fim de se criar um mapa com alguma lógica, deveriam juntar-se Campo, Carvalheira e Covide; Chamoim, Vilar e Moimenta; Chorense e Santa Isabel; Souto, Ribeira e Balança. No caso do Vale do Cávado, manter-se-iam as três freguesias existentes.
Só que esta junção trará sempre algum risco das freguesias mais pequenas terem que se subjugar aos interesses das mais fortes.
TH: Admite ser candidato a presidir uma Junta de Freguesia de maior dimensão, caso a lei assim o permita, depois da fusão destas três freguesias?
MA: Para já não penso nisso. Não digo que não possa fazer parte de uma equipa para gerir os destinos desta zona do concelho, mas a verdade é que para já não é uma equação em cima da mesa. Não descarto, contudo, essa possibilidade.
TH: Se fosse presidente da Câmara Municipal, qual seria a área em que atuaria de forma mais urgente para proporcionar um maior desenvolvimento do concelho de Terras de Bouro?
MA: No Plano Diretor Municipal, sem dúvida. Faria de tudo para proceder a alterações que beneficiassem as pessoas. É um grande entrave ao desenvolvimento do concelho. Terras de Bouro tem muitas freguesias fortemente penalizadas pelas reservas agrícolas e naturais. E o pior de tudo isto é que, definem áreas protegidas, criam limites à vida das pessoas, mas não oferecem ou sugerem contrapartidas.
TH: E se fosse primeiro-ministro, qual a primeira medida que tomaria para tirar Portugal do caminho que segue?
MA: Acima de tudo, deveríamos focar-nos em reduzir a despesa pública. Durante anos estudei em França e, atualmente, tenho pessoal lá a trabalhar e não se verifica o despesismo a que aqui se assiste. Gastamos muito dinheiro desnecessariamente, em cargos públicos remunerados vergonhosamente, em derrapagens sucessivas. Temos, no fundo, que fazer mais com menos dinheiro ou, antes, fazer melhor com os mesmos recursos. Reduzir despesas, sem cortar serviços, sabendo encaminhar os recursos e as pessoas para os departamentos certos.
Fonte: Terras do Homem, em 20-08-2012

Sem comentários: